Finalmente surgiram as primeiras fotos oficiais do tão comentado face-lift do Renault Clio vendido no Mercosul. Há tempos já se sabia que a sintonia com o modelo europeu não seria retomada em nosso mercado, menos ainda depois da chegada de sua quarta geração, com avanços enormes em todos os quesitos. Em vez disso, a Renault argentina daria mais um retoque à segunda geração para continuar como carro de entrada, mas até então não se sabia bem como ele ia ficar. Pois aqui você confere suas primeiras fotos oficiais.
Olhar este carro faz lembrar de tantos exemplos de “gambiarras” similares mesmo aos menos aficionados por carros, de forma que se torna até desnecessário explicar o conceito de face-lift de meia-vida ou o de reposicionar um modelo no mercado para estender seu ciclo de vida. Chevrolet Classic, Fiat Palio Fire, Ford Fiesta RoCam, Peugeot 207… as marcas e os modelos são muitos, mas a ideia é a mesma: se trazer o sucessor do Primeiro Mundo traz dificuldades cuja solução seria um preço alto demais, busca-se fazer o possível com o que se tem na mão para continuar vendendo bem. O Clio chegou ao país em meados dos anos 1990 ainda na primeira geração, importada da Argentina, mas isso só viria a ser uma estreia breve. O carro se estabeleceu no país só mesmo com a fase seguinte, chegando em 1998 com produção nacional e sintonia com o modelo europeu. Ele já chamava atenção por ser o primeiro Renault de preço baixo a chegar ao país, dado que a marca estreou por aqui com os primeiros Mégane e Scénic, mas era no estilo que o Clio cativava. Em momento algum suas linhas fugiam da criatividade exótica que caracterizou os carros dos anos 1990, em que o seu diferencial era a ausência de cantos retos: tudo nesse carro era arredondado, incluindo até o vidro traseiro.
Pouco depois veio o sedã, inexistente no projeto original. Se a adaptação turca não era um expoente em harmonia de estilo, o terceiro volume lhe dava porta-malas de 510 litros, o dobro do hatch e expressivo até hoje. E se tudo isso não fosse suficiente, o Clio caiu por completo no gosto das mulheres com séries especiais como Alizé e O Boticário, cuja lista de itens incluía revestimento dos bancos que não desfiava meias-calça. Por outro lado, ele lembrava dos homens com a versão Si, de acabamento esportivo e farto pacote de itens. Mais tarde a linha recebeu o primeiro face-lift, mas ainda em sintonia com a terra natal. A ideia era adaptá-lo às novas tendências da Renault ainda sem recorrer a uma nova geração, e isso incluiu passar a gama de versões das famosas siglas RL, RN e RT às palavras Authentique, Expression e Privilège, e a um estilo mais anguloso – detalhes como os faróis triangulares e a grade maior e horizontal faziam o carro remeter ao luxuoso Vel Satis. O lado curioso é que esta fase viu os maiores altos e baixos da história do carro: a chegada dos motores bicombustíveis lhe fez um concorrente de peso entre os nossos compactos da época, mas o ano de 2005 marcou o começo da decadência do pequeno Renault por aqui.
Na Europa, grande parte do carisma desse carro veio das versões esportivas, cujos destaques foram a Williams, ainda na primeira geração, e a V6 na segunda – sim, ele recebeu o 3.0 do Laguna com melhorias e o usou numa carroceria com dois lugares e posicionamento central, para chegar a mais de 200 cv. Com isso, a terceira geração honrava esse potencial com uma construção muito mais sofisticada, que anos depois rendeu incontáveis variantes esportivas com os mais variados temas. Trazer isso ao Brasil resultaria em preços muito mais altos que os do anterior, mas de qualquer forma a Renault não podia ficar parada por muito tempo: a concepção mais moderna de VW Fox e Ford Fiesta 5 só fazia acentuar a idade do carrinho francês. Foi quando nossa Renault teve a ideia de aproveitar a linha Dacia Logan, feita pela subsidiária romena de baixo custo mas com projeto igualmente moderno. Foi quando recebemos o sedã e o Sandero, este uma criação brasileira. Não se pode negar a perda de charme e requinte, mas as vendas da nova dupla confirmam que essa foi uma decisão acertada. Mas se o Logan preencheu por completo o espaço do Clio Sedan, sob o tamanho avantajado do Sandero ainda havia espaço para um modelo mais barato.
A segunda metade da década passada viu o Clio hatchback se relegar ao papel de carro de entrada, apoiando-se em vantagens como o preço baixo das versões de entrada e a confiança de um produto já bem estabelecido no mercado, mas com um diferencial: em vez de cortes extremos na lista de itens para alcançar o menor preço possível, a Renault manteve uns poucos mimos que fazem a diferença para quem tem o dinheiro muito contado: detalhes como tecidos e de melhor qualidade e revestimentos que eliminam ruídos corriqueiros ajudam a passar sensação bem melhor que a da média da concorrência. A produção do nosso Clio agora voltava à Argentina, mas com isso ele parecia ter recebido o destino de Fiat Mille e VW Kombi: sobreviver enquanto vender bem. A reviravolta veio justamente com o tal face-lift que aqui se apresenta, porque a julgar pelos padrões desse tipo de atualização, significa uma sobrevida de pelo menos quatro anos para o carro. Claro que a intenção da marca passa longe de vendê-lo como carro requintado ou algo do tipo, mas não se pode esquecer que essas estratégias de prolongar o ciclo de vida de um modelo devem ser usadas apenas como solução paliativa, pelo simples fato de que em pouco tempo o modelo perderá o interesse do público.
A ideia da Renault foi tornar o carro mais atraente e sintonizado com as tendências atuais. Mas se torna difícil demais fazer um carro de 1998 se parecer a um quinze anos mais jovem sem provocar impressões negativas. Estão lá alguns dos elementos do novo Clio francês, como os farois com máscara negra unidos por uma grade de perfil baixo que dá destaque ao logotipo da marca, mas eles não combinam com o carro. Você já deve ter reparado que os carros mais recentes usam dianteiras um tanto mais curtas e altas, mas bem mais integradas ao resto do carro. Pois é esse tipo de carroceria que combina bem com elementos grandes e vistosos como esses, porque se cria um efeito tridimensional que une visualmente capô, parachoque e laterais como um só elemento maior (o Fiat Punto foi um dos precursores dessa tendência). Já o Clio 2 ainda remete à época em que cada porção dessa parte da carroceria era bem separada. Essa dissonância se vê em itens como o capô, que “empresta espaço” à área da grade e dos farois com uma dobra circular tão forte que, com certos ângulos de luz, faz essa peça lembrar um assento sanitário. Já os farois de neblina ganharam um suporte tão exagerado que lhes deixa desconexos, ladeando um parachoque cujos vincos não fazem uma boa transição visual entre as superfícies que continua apenas por falta de espaço em altura.
Além disso, como você já pode imaginar, as laterais só não são uma perfeita viagem a 1998 porque os retrovisores agora são os do Sandero, maiores. Já a traseira não ficou feia, mas uma olhada mais atenta repara que foi porque ela não mudou quase nada. As lanternas ficaram mais modernas e integradas com a tampa traseira, mas um lamento vai para a parte superior: a simulação de spoiler tenta disfarçar que o Clio finalmente perdeu o vidro traseiro curvo, cujo charme de estilo parece não compensar mais os altos custos de fabricação dessa peça. O modelo sempre usará o 1.0 16v flex de antes, mas agora nas versões Authentique 2p (R$ 23.290) e 4p (R$ 24.290) e Expression 4p (R$ 24.950). O pacote de itens continua mínimo, mas agora todos trazem computador de bordo e predisposição para rádio de série, na mesma cabine de sempre. Ar-condicionado é um opcional de R$ 2.500 nas duas, mas só a segunda também traz a possibilidade da direção hidráulica, por R$ 1.100. As fotos indicam que o destaque desta fase do Clio será o mesmo do Fiat Uno: a personalização. Nas concessionárias será possível aplicar kits com adesivos e acessórios por dentro e por fora, seguindo três temas diferentes que incluem novo revestimento de bancos e até um adesivo que simula repintura de teto.